Cobras, lagartos, jacarés e outros animais nada fofinhos estão sendo usados para auxiliar pessoas com diferentes transtornos e deficiências. Esses bichos, diferentemente de cachorros e cavalos, tradicionalmente usados na chamada terapia assistida por animais, não costumam gerar empatia logo de cara. Mas psicólogos, biólogos e veterinários dizem que a convivência com os répteis também pode trazer benefícios.
Segundo
Daniela Gatti, psicóloga da ONG Walking Equoterapia, de São Paulo, que
usa os répteis há três meses, os animais são escolhidos segundo o perfil
de criança e o objetivo traçado na terapia. Para
isso, ela conta com a ajuda do biólogo Diego Sanchez da SOS Ambiental,
empresa que fez parceria com a ONG e cede os animais, todos certificados
pelo Ibama.
Uma
criança com TDAH (transtorno de deficit de atenção e hiperatividade)
pode, por exemplo, trabalhar com um jabuti, animal mais lento que exige
calma e atenção. Eduarda Mamono, 7, que tem o transtorno, recebeu a
missão de "cuidar" de uma iguana –alimentá-la e limpá-la– e até a
equilibrou na cabeça. No começo,
ela ficou um pouco receosa, algo relativamente comum entre as crianças.
Mas logo sentiu curiosidade para se aproximar do animal e tocá-lo.
O medo,
na verdade, é sentido mais pelos pais do que pelas crianças em
tratamento – e eles precisam ser informados da terapia e autorizar o
contato com os animais. "Se eu
mostrar os animais sem apresentá-los antes, o normal é que sintam medo e
até nojo. Mas digo qual é o habitat onde eles vivem, explico a
importância ecológica, que a pele deles é diferente, e aos poucos as
crianças vão chegando mais perto para participar", afirma o biólogo
Diego Sanchez.
Crianças
com síndrome de Down, autismo e paralisia cerebral também fazem a
"réptilterapia". "Uma das nossas crianças com autismo passou a falar
mais depois que começou a cuidar de um dos animais nas sessões. Forma-se
um vínculo entre a criança, o terapeuta e o animal, e assim vamos
trabalhando as queixas –a coordenação motora, por exemplo", diz Gatti.
Outro
ganho é na autoconfiança. "Há crianças que sofrem na escola por causa da
deficiência. A gente diz que o diferente também pode ser legal, e eles
se sentem especiais por limpar uma cobra e alimentar um jacaré, coisa
que os colegas não fazem", diz. O projeto Amazoo, em Jundiaí (SP), também usa animais não convencionais para fins terapêuticos.
O médico
veterinário Gustavo Bauer, do Grupo de Estudos do Benefício da Relação
Humano-Animal da Associação Brasileira da Indústria de Produtos para
Animais de Estimação, conta que o projeto já levou jabutis, serpentes e
calopsitas a escolas e clínicas com idosos com alzheimer e
esquizofrenia.
Maria de
Fátima Martins, professora de medicina veterinária da USP e uma das
pioneiras no estudo da zooterapia no país, também trabalha com animais
pouco usuais: ela criou o projeto Dr. Escargot, que leva o molusco em
escolas de Pirassununga (SP_ para crianças com e sem necessidades
especiais. "A zooterapia está
aberta a qualquer espécie, desde que haja respeito aos animais, preparo e
conhecimento para escolher os bichos certos para cada pessoa."
Ela diz que animais exóticos são ótimos para trabalhar a questão da diversidade. Martins,
porém, afirma que falta uma integração maior dessas práticas com a
universidade. "Seria interessante ter mais pesquisas. A gente sabe que o
animal faz bem, mas é preciso embasar os projetos e torná-los modelos
para serem replicados."
Fonte: Folha de S. Paulo
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